
Comunidade de Cardoso, em Baião (PA). Foto: Comunidade Amazônica
Termina no próximo sábado, 5 de fevereiro, em Itupiranga (PA), a caravana fluvial que vai percorrer 11 municípios ao longo do Rio Tocantins, numa atividade de mobilização das populações e comunidades em defesa do rio e de divulgação dos problemas socioambientais que devem ocorrer com as obras de construção da hidrovia Araguaia Tocantins e durante seu funcionamento.
Nesta terça-feira, 2 de fevereiro – a caravana que saiu de saiu de Barcarena (PA), no dia 30 de janeiro, fez parada no município de Tucuruí (PA), onde o grupo de mobilizadores vai percorrer via terrestre os municípios de Nova Ipixuna, Marabá, Itupiranga e Tauari para realizar diversas atividades com lideranças.
Serão três dias de trabalho que serão concluídos com um encontro de lideranças das duas comunidades: a jusante e montante da Usina Hidrelétrica de Tucuruí – a 350 km ao sul de Belém. A intenção é produzir um documento reunindo as preocupações e as propostas das comunidades a ser enviado para as autoridades estaduais, federais e internacionais.
Uma das coordenadoras da Caravana e secretária da CUT na comunidade quilombola de Mangabeira – Mocajuba (PA), Carmen Foro, explica que a experiência nos primeiros cinco superou as expectativas da recepção a conexão com as comunidades.
Nós fizemos visita a comunidades pesqueiras, quilombola, aos agricultores e agricultoras familiares, nós conversamos com a juventude, com mulheres organizadas, com os sindicatos de trabalhadores rurais, sindicatos da pesca, nós estamos fazendo um caminho que reúne toda essa diversidade daqueles e daquelas que irão ser impactados casos essa obra aconteça”, ressalta.
A hidrovia que integra o chamado corredor Arco Norte que trabalhará de forma multimodal no transporte de cargas (soja e minério, principalmente) através de ferrovia, rodovia e hidrovia desde os estados da região Central do país até o Porto de Vila de Conde, em Barcarena (PA), de onde seguirá pelo oceano aos mercados internacionais, está em processo de licenciamento ambiental no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA).
Segundo Carmem Foro, o retorno do trabalho tem se materializado na capacidade do Rio Tocantins em unir todas as pessoas, unir toda essa diversidade, unir todas aqueles e aquelas. acreditam que este não é o melhor modelo de desenvolvimento para a vida da população que vive e sobrevive nessas regiões.
“Nós vamos continuar nos posicionando e alertando as comunidades e lideranças dos impactos que vão acontecer com a construção desta hidrovia”, destaca.
Todos os integrantes da delegação estão vacinados e fizeram teste de covid-19 antes do embarque. Além disso, uma equipe de saúde está no barco para dar e se houver alguém com sintomas. Testes também estão sendo feitos em cada parada.
Os prejuízos já identificados
Com mais de dois mil quilômetros de extensão, o rio Tocantins é o segundo maior curso d’água 100% brasileiro, atrás somente do rio São Francisco. Nasce em Goiás, atravessa os estados do Tocantins e Maranhão para desaguar no mar, aqui no Pará, perto de Belém. No encontro com o rio Araguaia, forma a Bacia Hidrográfica do Araguaia-Tocantins.
Ao longo do Rio Tocantins, no Pará, vivem indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pescadores, extrativistas e agricultores familiares. Populações que tiram do rio o sustento para suas famílias e que movimentam a economia dos municípios da região.
Com base nos estudos já realizados pelo Governo Federal e pelas Universidades Federal do Pará e do Sul e Sudeste do Pará, é possível afirmar que os impactos no modo de vida das populações locais serão irreversíveis.
Ou seja, este é mais um projeto do Governo Federal na Amazônia onde os lucros ficam com as empresas e os prejuízos sociais e ambientais ficam para as cidades e comunidades. Um empreendimento que irá se sobrepor aos problemas já existentes, trazidos pela Barragem de Tucuruí, como a perda de espécies de peixe.
Alguns dos prejuízos:
- Aumento do risco de erosão e de assoreamento dos rios e canais, causando perda de qualidade da água e da biodiversidade, principalmente de espécies de peixes;
- Sobreposição de áreas de pesca com o canal da Hidrovia, o que irá gerar perdas de ambientes de pesca e consequentemente perdas de receitas para os moradores e municípios;
- Poluição por defensivos, resíduos urbanos, industriais ou de extração mineral, e óleo combustível das próprias embarcações;
- A circulação pelo rio sendo determinada pelo fluxo das barcaças, ou seja, a prioridade não vai ser o ribeirinho transportando sua produção, mas sim, as barcaças com o minério;
- Introdução de novas doenças na região, diante do aumento da migração populacional induzida e favorecida pela Hidrovia;
- Substituição indiscriminada de matas e florestas por monoculturas agrícolas, principalmente a soja;
- Perda de fertilidade e salinização do solo devido à irrigação;
- Ocupação das margens do rio pela extração indiscriminada de minério;
- Mudança no modo de vida e perda de bem-estar das populações locais.
A Obra
As obras previstas para o rio Tocantins têm como objetivo torná-lo navegável o ano inteiro. Envolve processos de dragagem e derrocamento, em trechos tanto a montante quanto à jusante do reservatório da Hidrelétrica de Tucuruí.
O projeto atende principalmente ao transporte de commodities, como a soja e o minério. Está inserido na lógica que prioriza a utilização dos rios da Amazônia não pelos povos da região, mas em benefício do grande capital, num crescente processo de privatização dos recursos hídricos do país.
Em 2016, o consórcio DTA/O’MARTIN, composto pelas empresas DTA Engenharia e O’ Martin-Serviços e Locação Ltda, venceu a licitação na modalidade menor preço para a elaboração dos projetos básicos e executivo, das ações ambientais, bem como a execução das obras de dragagem e derrocamento.
Segundo o Relatório de Impacto Ambiental da obra, o empreendimento é dividido em três trechos: 1) entre os municípios de Marabá e Itupiranga (52 km de dragagem); 2) entre Santa Terezinha do Tauiry e a Ilha de Bogéa (derrocamento ao longo de 43km); 3) entre os municípios de Tucuruí e Baião (dragagem ao redor de 125 km).
A dragagem é uma técnica de engenharia utilizada para remoção de materiais do solo, como sedimentos e rochas do fundo da água. Já o derrocamento é a retirada de material do rio não originado de assoreamento, ou seja, que naturalmente compõe o rio, usualmente pedregoso. No Tocantins, o processo acontecerá na região conhecida como Pedral do Lourenção que será implodido.
Segundo matéria do jornal Valor Econômico (24/01), o governo federal espera que até março o Ibama conceda a licença prévia do empreendimento.
A Caravana em Defesa do Rio Tocantins é uma realização da CUT Brasil, CUT Pará e Fetagri.Pa, em parceria com a Diocese de Cametá, Conselho Pastoral dos Pescadores, Universidade Federal do Pará, campus Tocantins Cametá, Levante Popular da Juventude, Sintepp – Cametá, Movimento dos Atingidos por Barragens, organizações de pescadores e de quilombolas da região, com o apoio do Solidarity Center/AFL-Cio, entidade sindical internacional.
Fonte: CNBB com informação da Comunicação da REPAM-Brasil e Diocese de Cametá (PA)